É caracterizado pelo abandono voluntario do pai ou da mãe em relação a um filho, veja que não se trata de abandono financeiro, um pai/mãe pode pagar pensões mensalmente e ser responsabilizado em dano moral por abandono afetivo. Vai muito além de necessidade material, se trata do amor, carinho, presença, atenção e orientação que todo filho espera de seus pais.
Trata-se de um direito Constitucional Federal/88: Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (grifo nosso).
Art. 229. CF/88 Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade. (grifo nosso)
Tratando ainda da Constituição federal, podemos destacar importantes princípios que são feridos com o abandono afetivo, como a dignidade da pessoa humana, igualdade, solidariedade, pluralismo das entidades familiares, tutela especial à família, principio da paternidade/maternidade responsáveis, dever de convivência familiar, proteção integral da criança e do adolescente, isonomia entre os filhos.
Temos muitos casos onde os pais da criança se divorciam e se afastam de seus filhos negligenciando os deveres básicos inerentes à paternidade e à maternidade, em aspecto básico do dia a dia, com isso causando um bloqueio psicológico enquanto criança, podendo influenciar diretamente na personalidade e causar traumas enquanto adulto, o filho tem o direito mesmo após a separação dos pais, de ter uma convivência com ambos, para terem um desenvolvimento sadio, não é atoa que temos a proteção contra quem tenta a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente, caracterizada como alienação parental.
A condenação em dano moral se torna uma forma coercitiva e indenizatória, perante a negligencia do pai/mãe em não conceder a orientação afetiva ao seu filho e uma forma de amenizar a dor e o abalo perante o abandonado.
Decisão do STJ
Segue abaixo parte do Voto da Ministra Nancy Andrighi, que exemplifica a reparação civil por abandono afetivo nas relações entre pais e filhos:
“RECURSO ESPECIAL Nº 1.159.242 – SP (2009⁄0193701-9)
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. FAMÍLIA. ABANDONO AFETIVO. COMPENSAÇÃO POR DANO MORAL. POSSIBILIDADE.
AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. DANOS MORAIS E MATERIAIS. FILHA HAVIDA DE RELAÇÃO AMOROSA ANTERIOR. ABANDONO MORAL E MATERIAL. PATERNIDADE RECONHECIDA JUDICIALMENTE. PAGAMENTO DA PENSÃO ARBITRADA EM DOIS SALÁRIOS MÍNIMOS ATÉ A MAIORIDADE. ALIMENTANTE ABASTADO E PRÓSPERO. IMPROCEDÊNCIA. APELAÇÃO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. […] Aqui não se fala ou se discute o amar e, sim, a imposição biológica e legal de cuidar, que é dever jurídico, corolário da liberdade das pessoas de gerarem ou adotarem filhos.
O amor diz respeito à motivação, questão que refoge os lindes legais, situando-se, pela sua subjetividade e impossibilidade de precisa materialização, no universo meta-jurídico da filosofia, da psicologia ou da religião.
O cuidado, distintamente, é tisnado por elementos objetivos, distinguindo-se do amar pela possibilidade de verificação e comprovação de seu cumprimento, que exsurge da avaliação de ações concretas: presença; contatos, mesmo que não presenciais; ações voluntárias em favor da prole; comparações entre o tratamento dado aos demais filhos – quando existirem –, entre outras fórmulas possíveis que serão trazidas à apreciação do julgador, pelas partes.
Em suma, amar é faculdade, cuidar é dever […].”
Obrigação de amar?
Será que teríamos um motivo justo para uma mãe/pai, deixar de prestar amor e afeto a um filho, não se trata especificamente de obrigar a amar e sim a de ser responsável pela obrigação não só familiar, mas social.
O projeto familiar hoje está assentado no afeto, solidariedade, confiança, respeito, união. Ninguém e obrigado a ter filhos, porém tendo acarreta-se consigo responsabilidades individuais: obrigações, deveres, bem como direito a ambos.
Não importando como uma família foi constituída, se pelo casamento, pela união estável se pela homoafetividade ou fora da relação familiar, deve se ter o dever de respeitar, educar e auxiliar os filhos. Sendo obrigatória a isonomia entre os filhos (art. 227, parágrafo 6° da CF) vedada às designações discriminatórias, ou seria justo haver diferenças com filhos nascidos na constância do casamento, com os que foram nascidos fora da constância do casamento? …
Portanto o filho que se sente afetado pelo abandono afetivo do seu pai/mãe pode requerer dano moral, para responsabiliza-los financeiramente pelos abalos sofridos.
Referências:
BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Recurso Especial nº 2009⁄0193701-9. Recorrente: Antonio Carlos Jamas dos Santos. Recorrido: Luciane Nunes de Oliveira Souza. Brasília (DF), 24 de abril de 2012. Disponível em: <http://s.conjur.com.br/dl/acordao-abandono-afetivo.pdf> Acesso em: 30 de julho de 2012.
Sobre a autora:
Michele Nogueira de Souza
Formada Faculdade Interamericana de Porto velho- UNIRON. Sempre esteve envolvida com o direito, principalmente durante os estágios obrigatórios desenvolvidos pela universidade. Hoje, advogada inscrita no quadro da OAB/RO, atua prestando consultoria e assessoria tanto no contencioso quanto no preventivo, trabalhando junto ao cliente na busca pela resolução de questões burocráticas e no intuito de apresentar realmente um serviço diferenciado a este. Atualmente está cursando pós-graduação em Direito Processual Civil e Direito e Processo do trabalho. E-mail: [email protected]